quarta-feira, 29 de abril de 2009

Os Cegos e o Elefante

A paródia, no sentido proposto por Linda Hutcheon em seu Uma teoria da paródia: ensinamentos das formas de arte do século XX (1985), tem sido uma constante na minha vida profissional (e por que não dizer pessoal?!). Explico: desde muito cedo, a paródia, como elemento de ressignificação de um texto tem sido objeto de estudo em minhas aulas, quer seja com alunos do 6º ano da escola pública, quer seja com alunos do 3º ano do Ensino Médio da rede particular, quer seja, ainda, com alunos do curso de Formação de Professores (Lato Sensu) e, pelo andar da carruagem, não será diferente em nossa troca de experiências com os professores cursistas de Língua Portuguesa, do Programa Gestar II, da Prefeitura Municipal de Olinda. Mas, sobre este assunto, as nossas aulas, trataremos em breve.

Por ora, voltemos à paródia e como ela está presente em minha formação. Em 2005, dei início, na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), ao Mestrado em Letras cuja linha de pesquisa “Leituras dos textos literário e fílmico” possibilitou-me investigar como a inserção dos símbolos do poder capitalista na construção do espaço social da adaptação fílmica poderia ampliar os significados do texto adaptado e como aquela linguagem, através do recurso da paródia (como escárnio e/ou gozação também) poderia promover a reflexão crítica acerca da homogeneização da cultura na formação do modo de vida contemporâneo.

Esta tarefa precisava, antes de tudo, ser pra-ze-ro-sa, pois eu tentava conciliar a professora e a pesquisadora que há em mim entre as cidades de Recife e João Pessoa (PB). Acreditem, nunca senti tanto prazer em estudar e, principalmente, em descobrir que ser professora havia sido uma escolha acertada. A fim de compartilhar o resultado desta tarefa que é o resultado de muitas vozes: a minha, dos amigos (mestrandos ou não) que foram generosos ao ler o texto durante o processo, aos professores da Pós-Letras (UFPB e UFPE), da minha família, bem como de todos aqueles que poderão ainda contribuir com sua leitura crítica do texto, publiquei, recentemente, SHREK, DO CONTO AO FILME: um “reino” não tão distante (Dissertação de Mestrado).

O (agora) livro foi construído a partir da relação paródica que há entre o conto Shrek! (2001), de William Steig, e a animação Shrek 2 (2004), mais especificamente, de Andrew Adamson. É preciso dizer ainda que a ideia da pesquisa surgiu quando, junto com meus alunos do 9º ano, à época 8ª Série, discutíamos a atualidade/relevância da adaptação fílmica, o que despertou em mim o desejo de conhecer o texto fonte. Naquele momento, e parodiando Rubem Alves ainda que às avessas, “compreendi que a escola tinha, sim, lugar para as curiosidades que estavam na minha cabeça”.

Esse comentário todo acerca da paródia e de meu objeto de pesquisa na Pós-Graduação é porque eu gostaria de justificar a escolha do título do blog: Os cegos e o elefante. Será que devo mesmo? Não, acho melhor não!

Octavio Paz, citado por Rubem Alves, “diz que a resposta a um texto (e, acrescentamos, a um título) nunca deve ser uma interpretação. Deve ser um outro texto. Assim, quando um professor lê um poema para os seus alunos, deve fazer-lhes uma provocação”- deixem-me, então, fazer-lhes a minha: O que o título desse blog lhes sugere? O que vocês, caros professores cursistas, veem? Que imagens? Que associações?”

Talvez, eu deva ajudá-los. A ideia surgiu quando eu estava (re)lendo o livro Os Cegos e o Elefante: alguns modos de ler poemas (UFPB, 2005). São, segundo os seus organizadores (e também autores), “diversas tentativas de análise e/ou interpretação de poemas”, “um trabalho em conjunto de alunos e professores “ (p. 9), que vão desde erro de português, de Oswald de Andrade – em sua análise, José Edilson de Amorim indaga “se o poema não estaria cegando o fio de sua fina paródia da nossa colonização, apagando as marcas de um encontro nada amistoso, ao imputar à natureza o mal entendido do gesto português” (Grifos do autor, p. 18) - passando por Momento num café, de Manuel Bandeira, a transborda, de Arnaldo Antunes. Lembra-lhes algo? Antes que respondam a essa questão, sugiro a leitura da lenda (ou conto) oriental, sobre três (muitos adaptadores afirmam que são seis) cegos e um elefante. A versão que lhes apresento, já é uma adaptação do poeta americano John Godfrey Saxe (1816-1887). Em tempo: já existe “A verdadeira história dos cegos e do elefante”. Paródia? Boa leitura!

Eram seis homens do Industão

Que gostavam muito de aprender

E que foram um elefante ver

(Apesar de serem todos cegos)

Cada um fez sua observação

Na tentativa de se satisfazer

O primeiro se aproximou do elefante

E quase a cair

Contra o lado firme do gigante

Logo começou a bramir

“Deus me ajude, mas o Elefante

é muito parecido com uma parede!”

O segundo, sentindo a presa,

Gritou, “ Oh, o que temos aqui,

Tão redondo, liso e afiado?

Para mim está claro

Que a maravilha do Elefante

Se parece com uma lança!”

O terceiro se aproximou do animal,

E aconteceu de tocar

Na tromba com as suas mãos,

E assim sem medo falou

“Agora eu vejo”, ele disse, “o Elefante

Se parece com uma serpente!”

O quarto alcançou uma pata

E a sentiu próximo do joelho,

“Que maravilhosa besta é esta

É bem direta” ele disse;

“Está claro que o Elefante

Se parece muito com uma árvore!”

O quinto, que tocou a orelha

Disse “Até o mais cego

Pode dizer que ele se parece mais,

Negue quem puder,

O maravilhoso Elefante

e muito parecido com um abanador!”

O sexto logo começou

A tentar agarrar a fera,

quando o rabo se movimentou

E o sentimento que ele sentiu:

“Eu vejo”, ele disse, “o Elefante

Se parece com uma corda!”

E estes homens do Industão,

Discutiram alto e por muito tempo,

Cada um a sua própria opinião

Mantendo uma firme posição,

E apesar de cada um estar certo em parte

Todos estavam errados!

Moral:

Muitas vezes em guerras teológicas,

Os que as disputam, penso eu,

Criticam a ignorância

que dos outros ouviu

e afirmou sobre um elefante

Que nenhum deles jamais viu!

Nossas Oficinas nem bem começaram, e peço-lhes que, como recomenda Octavio Paz, não se entreguem à duvidosa tarefa de descobrir o que o conto (e consequentemente o título desta página) quer dizer, entreguem-se “à criativa tarefa de produzir o seu próprio texto”; sugiram, ainda, possibilidades de trabalhá-lo com nossos alunos, pois este parece ser um desejo de muitos de vocês, professores cursistas, quando indagados sobre o que esperar do Gestar II como um programa de formação continuada em serviço, e em que ele (o Gestar) poderia ajudar na sua formação:

“Favorecer o contato com pesquisas, perspectivas metodológicas e avaliativas. O programa pode propiciar o acesso a informações que contribuam para a minha atualização profissional” (André Luiz Marinho, EJA).

“Pode ajudar a planejar melhor as aulas” (Maria de Fátima G. de Lima, Escola Duarte Coelho)

“Instruir-me nos conhecimentos que ignoro e aperfeiçoar-me naqueles que possuo” (Israel de Oliveira, Escola Vereador José Mendes).

“Melhorar o meu desempenho com o alunado” (Ângela Cristina F. Costa, Escola Gregório Bezerra).

“Renovar a minha prática em sala de aula” (Janaína Figueiredo, Escola Antônio Correia)

Aguardo ansiosa por suas experiências.

Um abraço,

Edvânea Maria