quinta-feira, 7 de maio de 2009

Vale a pena conferir

Professores (as) cursistas, vale a pena conferir a matéria abaixo publicada na Revista Nova Escola, edição 222, maio/2009, não só por abrir “a caixa preta” da Prova Brasil, mas, principalmente, por tocar em um tema discutido em nossa primeira Oficina: os gêneros textuais. A matéria discute também o fato de que, nesse exame, nunca se pede para que se identifique a que gênero um texto pertence; sendo assim, parece que nossas reflexões estão no caminho certo... Boa leitura!

Leitura de textos de gêneros diferentes
As questões exigem a compreensão de textos variados - quadrinhos, fábulas, notícias, verbetes etc. - e a familiaridade com a leitura deles. A definição de qualquer um dos tipos nunca é pedida
Anderson Moço (novaescola@atleitor.com.br)

A Prova Brasil de Língua Portuguesa avalia somente a leitura, e o texto é sempre a menor unidade de sentido. À criança, nunca é proposta a leitura de palavras ou frases isoladas - e isso desde os níveis iniciais. O exame exige a familiaridade com diferentes gêneros - artigo de opinião, notícia, verbete, fábula, conto, quadrinhos etc. -, sempre apresentados antes de cada uma das 39 questões. Todas contêm quatro alternativas de resposta (apenas uma é correta) e se refere a um descritor.

Uma ideia básica norteia toda a prova: as habilidades que um aluno mobiliza para dar sentido a uma leitura estão diretamente relacionadas ao material que ele lê. "A tarefa terá uma complexidade diferente, dependendo do gênero apresentado à garotada e da linguagem utilizada, além da familiaridade com o assunto tratado", explica Maria Teresa Tedesco, do Colégio de Aplicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, coautora do estudo do Inep.
A seguir, analisamos questões do mesmo tipo que as contidas na Prova Brasil para que você compreenda como ela checa as habilidades que todos deveriam possuir na 4ª série. Por causa do espaço, relacionamos vários exemplos a apenas uma notícia e um verbete.

Algumas perguntas pedem para "Identificar o tema de um texto". Quando elas se referem a uma notícia, quem já está familiarizado com o gênero sabe que ela anuncia um evento a ser realizado no futuro próximo ou relata um fato já acontecido. Conhece também outra característica dele: o título sintetiza as informações, como em Festividades da Semana do Descobrimento Começam Amanhã (leia no primeiro quadro abaixo). Dessa forma, fica mais fácil responder corretamente.
A mesma tarefa, se referente a um verbete (confira no quadro o exemplo Há 500 Anos...), implicaria outro tipo de conhecimento. A garotada que é frequentemente apresentada a esse gênero sabe que, por vezes, é necessário relacionar segmentos para compreendê-lo. O título não indica que o conteúdo se refira às caravelas, o que se revela com a leitura dos tópicos seguintes. Nesse caso, a tarefa se mostra mais complexa.
Encontrar informações explícitas exige leitura atenta

Em outro tipo de pergunta da Prova Brasil, pede-se para a criança "Localizar uma informação explícita no texto". A dificuldade também aí será variável. Se, com base no verbete Há 500 Anos..., fosse indagado quando as caravelas foram criadas, a informação seria encontrada no segundo tópico. Tomando novamente a notícia Festividades..., o desafio poderia ser indicar o local das comemorações. No começo, é relatada a programação de Porto Seguro e só no último parágrafo cita-se a festa de Cabrália. Para acertar, é preciso encontrar informações em pontos distintos. Portanto, mesmo que o descritor pareça abordar uma habilidade bastante simples, nem sempre é isso o que se vê.

Outro exemplo: quando a tarefa diz respeito à habilidade de "Inferir o sentido de uma palavra ou expressão", uma indagação possível com base na notícia Festividades... seria referente à expressão "passar em branco". O que o autor deu a entender com ela? Com referência ao texto Há 500 Anos..., tarefa semelhante poderia abordar causaram "a maior sensação". Responder a ambas não é fácil. Para descobrir o sentido delas, a criança precisa ficar atenta ao contexto e às pistas linguísticas. "Somente ao ativar os conhecimentos que já tem sobre o gênero, ela vai encontrar o significado da expressão", ressalta a linguista Kátia Bräkling, professora do Instituto Superior de Educação Vera Cruz, em São Paulo, e coautora do estudo do Inep.

Nos casos aqui abordados - assim como em todo o exame -, nunca é pedido que se identifique a que gênero um texto pertence. Isso porque o mais importante é compreender qual a finalidade comunicativa de cada um deles. Uma das habilidades requeridas na prova é justamente esta: "Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros". Nos dois exemplos que utilizamos, a resposta é a mesma: trazer informações. "Não há outra maneira de os estudantes reconhecerem isso senão tendo o maior contato possível com diferentes gêneros e suas características", diz Kátia.

Festividades da Semana do Descobrimento
Começam Amanhã 18/04/06
Mais uma vez a festa do Descobrimento chega este ano repleta de comemorações, prometendo se firmar como um dos mais importantes eventos do calendário da Costa do Descobrimento.
Em Porto Seguro, prefeitura e iniciativa privada promovem uma grande variedade de eventos, com shows, apresentação teatral, missa campal, jogos, danças indígenas, queima de fogos e festival de cinema e vídeo.
O prefeito de Porto Seguro, Jânio Natal (PL), adianta que vai investir cada vez mais na celebração da Semana do Descobrimento, pela importância da data, não apenas para o município, mas para todo o Brasil. Porto Seguro é a única cidade do país que possui certidão de nascimento, registrada através da histórica carta de Pero Vaz de Caminha. E não podemos deixar de comemorar a data do nascimento do Brasil em alto estilo, aqui, onde tudo começou, enfatiza.
Cabrália também promete não deixar a festa passar em branco, com os jogos indígenas pataxós, de 19 a 23 de abril; e no dia 26, missa com o padre Antônio Maria e a presença da cantora Fafá de Belém, que cantará a Ave Maria e o Hino Nacional.
Fonte: www.portoseguronoticias.com.br/turismo/mat09_turismo.html

Há 500 anos...
As caravelas causaram a maior sensação na época do Descobrimento do Brasil.
Veja abaixo por que elas eram o auge da tecnologia da época:
VELAS - As caravelas foram inventadas no século 16, quando não havia motores. Os barcos tinham de se mover aproveitando o vento. Para isso, contavam com as velas. Quando as pessoas tinham de ir contra o vento, navegavam em ziguezague.
CASCO - Os navios eram feitos todos de madeira. Por isso, eram muito frágeis. Mas foi assim que Pedro Álvares Cabral saiu de Portugal, atravessou o Atlântico e chegou ao Brasil. Hoje em dia, os cascos dos navios são de aço. Mas como a água não entrava entre as tábuas? Elas eram tapadas com cordas embebidas em alcatrão, que é uma mistura de substâncias como a própria madeira e o carvão.
PORÃO - Para a caravela manter-se em pé na água, levava bastante peso no porão. Esse peso era chamado de lastro e podia ser composto de pedras e balas de canhão.
QUILHA - A quilha permitia que o navio navegasse em linha reta.
Fonte: www.portoseguronoticias.com.br/turismo/mat09_turismo.html

Reportagem sugerida pelos leitores Denise Morais, Ataleia, MG, Diógenes Henrique Rodrigues da Silva, Itapipoca, CE, Kezya Bernardino, Acarau, CE, e Priscila Santana Suetu, Planaltina, DF

domingo, 3 de maio de 2009

Registrando a Formação...

O primeiro encontro do Gestar II com os professores cursistas de Língua Portuguesa da Prefeitura Municipal de Olinda aconteceu no dia 29/04/2009 e estava recheado de expectativa dos coordenadores, professores e minha, é claro. Isso ocorreu, talvez, devido às frustrações que temos tido com algumas das formações que tivemos ao longo do Magistério...
Reticências à parte, todos que tiveram acesso ao material alguns dias antes da primeira Oficina, forma unânimes no que diz respeito à ótima qualidade do material; era preciso, portanto, que as nossas discussões (troca de experiências) fossem densas, mas leves, criativas e, sobretudo, práticas.
Levando em consideração que apenas alguns poucos professores haviam recebido os livros do Gestar, lido as Unidades 9 e 10 da TP 3 que aborda o tema transversal “trabalho”, e que os demais cursistas estavam tendo um primeiro contato com a proposta do Gestar a partir daquele momento, achei que seria interessante aplicar uma metodologia similar àquela utilizada pelos professores da UNB com os professores formadores do Gestar-PE, para discutirmos os Gêneros Textuais.
O texto escolhido para abordar o assunto foi o poema-canção “Romance da Filha do Imperador do Brasil”, que é de domínio público, foi musicado por Antônio Nóbrega em seu CD Lunário Perpétuo, e está no Romance da Pedra do Reino, de Ariano Suassuna:

O Imperador Dom Pedro
tem uma Filha bastarda,
a quem quer tanto do bem
que ela ficou malcriada!
Queriam casar com ela
Barões de capa e de espada.
Ela, porém, orgulhosa,
a todos que recusava:
- Este, é menino! Esse é velho!
Aquele, lá, não tem barba!
O de cá, não tem bom pulso
pra manejar uma Espada!

Dom Pedro falou, se rindo:
- Inda serás castigada!
Não vás tu, de algum Vaqueiro,
terminar apaixonada!

Na fazenda de seu Pai,
já no fim da madrugada,
um dia, numa janela,
a Infanta se debruçava.
Viu passar três moradores
que trabalhavam de enxada.
O mais garboso dos três
era o que mais trabalhava.
Tanto plantava Algodão,
como do Gado cuidava.
Vestia Gibão de couro,
fortes sapatos calçava.
N'aba do chapéu de couro,
fina prata se estrelava.
Pois logo, desse Vaqueiro,
a Infanta se apaixonava.
E o Vaqueiro, só cavando:
ele sabe o que cavava!

A Princesa chama a Velha
em que mais se confiava:
- Estás vendo aquele Vaqueiro,
trabalhando, ali, de enxada?
Condes, Duques, Cavaleiros,
por nenhum eu o trocava!
Vai chamá-lo aqui, depressa,
e ninguém saiba de nada!

A Velha vai ao Vaqueiro
que na terra trabalhava:
- Vem comigo, meu Vaqueiro!
Por que essa vista baixa?
Levanta os olhos, que vês
a Estrela da Madrugada!

Entraram pelo portão,
que a Porta estava fechada.
Na camarinha da Moça
o Vaqueiro já chegava:

- Senhora, o que é que me manda?
Eu vim por vossa chamada!
- Quero saber se te atreves
a queimar minha Coivara!
- Atrever, me atrevo a tudo,
que um homem não se acovarda!
Dizei-me, porém, Senhora,
onde está vossa Coivara!
- É abaixo dos dois Montes,
na Fonte das minhas águas,
abaixo do Tabuleiro
e na Furna da Pintada,
na linha da Perseguida,
no corte da Desejada!

Passam o dia folgando,
o mais da noite passavam,
e o Vaqueiro socavando:
ele sabe o que cavava!
À meia-noite, a Princesa
pediu tréguas, por cansada:
- Basta! Basta, meu Vaqueiro!
Queimaste mesmo a Coivara!
Não sei se por varas morro
ou com ela incendiada!
E, assim, a filha do Rei
do orgulho foi castigada!


Nóbrega, mais do que cantar, interpreta os personagens da narrativa o que torna o texto ainda mais interessante. Mas, a principal razão por escolher esse texto tem a ver com a culminância do Gestar II, em que os professores deverão entregar um projeto, de preferência interdisciplinar, para ser vivenciado em suas escolas no próximo ano. Este poema permite a nós, professores de Língua Portuguesa, trabalhar em conjunto com os professores de História, por exemplo.
Após a análise do texto em que discutimos o processo de colonização que sofremos à época do “descobrimento”, abordamos também a relação entre o Brasil real - leia-se: honrado, trabalhador, destemido e que tem como representante a figura do Vaqueiro - e do Brasil oficial, representado na figura do Imperador e de sua filha bastarda, uma referência, talvez, ao fato de não ser a Princesa uma filha legítima desta terra?!

Em nossa discussão, observamos, ainda, que a escolha do léxico ratifica os elementos que caracterizam esses Brasis: Gibão de couro, Vaqueiro, Plantar algodão, Enxada, Gado, Tabuleiro, Coivara, etc; Princesa, Conde, Duques, Cavaleiros, camarinha e o uso dos pronomes de tratamento como “vossa”. A fim de observar um pouco melhor essas e outras questões, sugeri-lhes a leitura da análise que faço do poema e publicado no artigo: “BRASIL REAL x BRASIL OFICIAL: O Combate no romance da Filha do Imperador do Brasil”, publicado no II Colóquio Internacional de Políticas e Práticas Curriculares: Impasses, Tendências e Perspectivas (João Pessoa, 2005).

Feitas essas considerações, pedi-lhes que formassem quatro grupos para que pudessem produzir textos diversos a partir do “Romance da Filha ...”.

Grupo 1- contratar empregados
Grupo 2- elaborar pedido de casamento
Grupo 3- tentar entrar na casa da Princesa
Grupo 4- propor queimar a “coivara”

Imediatamente, alguns professores preocuparam-se em saber com que gênero textual deveriam trabalhar, pois “não gostariam de produzir um gênero semelhante ao do outro grupo, uma vez que a quantidade dos gêneros era limitada”. Nesse momento, percebi que havia uma confusão entre gêneros e tipos textuais. Sugeri que não se preocupassem com nomenclaturas, apenas, criassem e depois socializassem suas produções. O resultado não poderia ser mais lúdico e serviu para integrar um pouco mais os professores cursistas.

Eis algumas de suas produções que foram socializadas:

Procura-se um vaqueiro garboso
Para imediata contratação
Forte, trabalhador, vistoso
Que de gado saiba cuidar e baita disposição
Com disponibilidade de horário, salário a combinar
Pronta estará a princesa para a sua coivara queimar
E o rei esperando, ansioso, as condições negociar

Equipe: Alethea Neves, Jaciara Santos, Jenny Elane, Marcia Cilene, Maria de Fátima, Plécia Duarte, Sueli Cristina, Yanna da Rocha.

Pedido de casamento
Princesa bonita
No cabelo laço de fita
És a estrela mais rica
Eu, um vaqueiro apaixonado
Desejo que sejas a estrela
Que me guiará nessa vida
E que me aquecerá na noite fria
Aceite desse seu serviçal apaixonado
Este pedido que não seja rejeitado
Confirme este meu pedido
De vaqueiro apaixonado
Basta aparecer na janela
Mostrar tua face branca e bela

Equipe: Angela Santos, Angela Costa, Andra Araújo, Valdete Amorim

A fuga da princesa
Minha gente escuta agora
Prestem muita atenção
O causo que vou contar
Uma história de ação
De um vaqueiro apaixonado
Que traça um plano pra roubar
Uma princesa danada
Que roubou seu coração

O plano assim começa:
Após uma semana de observação
De toda fazenda dela
Ele aproxima-se da velha
Confidente da princesa
E esta ficou à espera

Com a ajuda da velha
Que facilitou pra ele a entrada
Disfarçando-se de empregado
Cuidava do gado e do pasto
Adentrou a porta fechada
De vaqueiro vestiu sua amada
E a roubando de casa
Felizes pegam a estrada.

Equipe: Cassia Souza Leão, Elizabete Tomaz, June Travassos, Lucinda Trindade, Maria do Socorro Marinho, Nara Alves, Rejane Vitorino, Sandra Amaral

Receita de coração domadoIngredientes:
- 0 grama de nobreza da Princesa;
- 50 gramas de atitude;
- 1 velha disponível;
- 100% do fogo da Princesa;
- 100% de disposição de um vaqueiro.

Modo de preparo:
Peque uma princesa não muito nobre e mal intencionada, e misture um pouco de atitude. Em seguida, junte a essa mistura uma velha alcoviteira que traga um vaqueiro com 100% de disposição para apagar o fogo de uma princesa. Em algumas horas, você terá um vaqueiro saciado e uma princesa escravizada.

Equipe: Janaína Ferreira, Rosileide Ferreira, Iris Costa, Antônia Caçula, Márcia Vilar

Inicialmente, não houve a preocupação em classificar os textos como “anúncio de jornal”, “receita” ou “cordel”; na verdade, os professores divertiram-se com as apresentações e teceram comentários acerca da criatividade dos textos. Em seguida, uma professora cursista gostaria de saber “como trabalhar textos longos se a escola em que trabalha encontra-se em reforma e não há sequer um quadro de giz?”, “Deveria explicar os diferentes tipos (sic) de gêneros textuais para que os seus alunos do 6º ao 9º tivessem um ‘modelo’ a seguir”?
Este momento foi importante uma vez que nos permitiu discutir sobre “até que ponto conhecer uma nomenclatura nos torna competentes em situações comunicativas”, bem como observar, através de suas próprias produções, que os Gêneros Textuais “surgem, situam-se e integram-se funcionalmente nas culturas em que se desenvolvem. Caracterizam-se muito mais por suas funções comunicativas, cognitivas e institucionais do que por suas peculiaridades linguísticas e estruturais. [...] Quase inúmeros em diversidade de formas, obtêm denominações nem sempre unívocas e, assim como surgem podem desaparecer” (MARCUSCHI, apud TP 3, 2008, p. 45).

Para ratificar a citação acima, mostrei-lhes diversos exemplos de gêneros textuais, a exemplo de

Um E-mail para Sua Majestade,
De: pero.vaz.caminha@paubrasil.com.br
Para: domjoao@atrasdosmontes.portugal.gov
Assunto: Quais Índias eram mesmo?
E aí, Majestade, tudo beleza? - Não chegamos bem exatamente às Índias, mas de qualquer jeito há índias. Os ventos trouxeram-nos aos mares do sul, a um lugar desconhecido da civilização até o momento. É uma ilha de belezas imensuráveis e de riquezas incalculáveis e, para melhorar, já temos controle total sobre seus habitantes.
Porém, tivemos várias situações estranhas.
Ao atracarmos às margens da ilha, por exemplo, uns índios mal-encarados queriam cobrar para vigiar nossas caravelas.
Caso não pagássemos, eles riscariam os cascos. Então, para não criar conflitos, pagamos com alguns sacos de farinha. O interessante é que, a partir desse dia, toda a economia da ilha foi indexada ao saco de farinha. Criaram até a Bolsa de Farinha, que por sinal, hoje está operando com alta de 0,3%. (...)
A propósito, esta carta está sendo enviada por meio de Tambornet. Espero que chegue. Eles falaram que é confiável. Para maiores detalhes, dê retorno...
(H. Anunciação . Exame, 30/06/99, p. 142.)

Ora, está claro que, à época de Pero Vaz Caminha, sequer sonhávamos com a internet; logo, o gênero textual “e-mail” ainda não havia sido inventado, e, como afirma Marcuschi, assim como surgiu, ele poderá desaparecer.

A fim de diferençar gênero de tipo textual, chamei-lhes a atenção para o fato de o e-mail possuir uma função social de “dar conhecimento de algo a alguém” (TRAVAGLIA), o que faz do e-mail um gênero textual; por outro lado, esse gênero contém uma sequência narrativa, em que o invasor (Pero Vaz) relata o que aconteceu quando ele (não) chegou às Índias: “Ao atracarmos às margens da ilha, por exemplo, uns índios mal-encarados queriam cobrar para vigiar nossas caravelas”, mas também uma descrição sobre as belezas desta terra: “uma ilha de belezas imensuráveis e de riquezas incalculáveis”. Em outras palavras, estamos diante de duas tipologias textuais: narração e descrição, que não possuem função social e definem-se como “categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal”.

Isso posto, retornamos a uma estrofe de o “Romance da Filha...” para comprovar que neste gênero há a presença de dois tipos textuais, a saber, narração e descrição:

Na fazenda de seu pai,
Já no fim da madrugada,
Um dia, numa janela,
A infanta se debruçava.
Viu passar três moradores
Que trabalhavam de enxada.
O mais garboso dos três
Era o que mais trabalhava.
Tanto plantava algodão,
Como do gado cuidava.
Vestia gibão de couro,
Fortes sapatos calçava.
N'aba do chapéu de couro,
Fina prata se estrelava.
[...]


Esta discussão possibilitou identificar as características que levam à classificação de um gênero textual, bem como classificar as sequências de base no interior desse texto como tipos textuais. À medida que se tornava mais clara a diferença entre gêneros e tipos textuais, os professores cursistas iam tomando como objeto de análise suas próprias produções (gêneros textuais), a exemplo de “Classificados poéticos” cuja tipologia predominante, a descrição (sequência de base) é empregada com o objetivo de caracterizar a Princesa como: linda, negra, fogosa, caliente.
Resolvida a questão entre gêneros e tipos textuais, partimos para as sugestões de textos, verbais ou não-verbais, que poderiam ser trabalhados em sala de aula - observando sempre a variação tipológica deles - e que pudessem “gerar” outros gêneros textuais. Como exemplo, sugeri-lhes:

TEXTO 1
POEMA TIRADO DE UMA NOTÍCIA DE JORNAL
Manuel Bandeira

João gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia
[num barracão sem número.
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.


TEXTO 2
Cidadão, Zé Geraldo
Tá vendo aquele edifício moço?
Ajudei a levantar
Foi um tempo de aflição
Eram quatro condução
Duas pra ir, duas pra voltar
Hoje depois dele pronto
Olho pra cima e fico tonto
Mas me chega um cidadão
E me diz desconfiado, tu tá aí admirado
Ou tá querendo roubar?
Meu domingo tá perdido
Vou pra casa entristecido
Dá vontade de beber
E pra aumentar o meu tédio
Eu nem posso olhar pro prédio
Que eu ajudei a fazer
[...]

Os próprios professores elencaram uma variedade de gêneros que seus alunos poderiam criar a partir desses textos.

Após uma breve pausa para o Café com prosa, retomamos nossa Oficina. Para tanto, introduzi o “Troca-troca de experiências”, inspirado na revista anual Ação Troca-troca: experiências educacionais, publicada pela Secretaria de Educação e Desporto de Olinda/ Divisão de Ensino Fundamental. O objetivo era partilhar os nossos trabalhos, como professores formadores, produzidos no encontro que tivemos de 1º a 5 de dezembro de 2008. Dentre os textos produzidos, apresentei-lhes não só o divertido “plano de roubo” das formadoras Rejane Rodrigues (Verçosa), Gislaide de Oliveira (Arcoverde), Luciane Angelo da Silva (Toritama), Valdilene Josefa de Andrade (Lagoa dos Gatos), todas moradoras do Agreste e do Sertão pernambucano.

Mano Urubu,
Consegui penetrar na mansão do bacana, através de seu filho Eduardo. E adivinha só? Ele me deu todo o serviço.
Vamos arranhá-la na quinta-feira, na maior tranquilidade, pois seus pais não estarão em casa. Entraremos pela porta lateral, que dá acesso à garagem e ao resto da mansão. Lá dentro cada um vai para um cômodo. Na sala, você pega toda a porcelana, prata e cristais.
Enquanto eu subo até o quarto, pego as joias que estão no cofre e, no escritório, a coleção de selo e moedas raras.
Nos encontramos na garagem onde há bicicletas com marcha para levarmos o bagulho.
Não farrape! Até quinta!
Marcão


Feita a troca de experiências, passamos à fase seguinte: pedi que juntos fizéssemos uma leitura dos textos das páginas 15 e 20 do caderno de Atividade de Apoio à Aprendizagem (AAA3), dentre eles, Essas Meninas, de Drummond

As alegres meninas que passam na rua, com suas pastas escolares, às vezes com seus namorados. As alegres meninas que estão sempre rindo, comentando o besouro que entrou na classe e pousou no vestido da professora; essas meninas; essas coisas sem importância.
O uniforme as despersonaliza, mas o riso de cada uma as diferencia. Riem alto, riem musical, riem desafinado, riem sem motivo; riem.
Hoje de manhã estavam sérias, era como se nunca mais voltassem a rir e falar coisas sem importância. Faltava uma delas. O jornal dera a notícia do crime. O corpo da menina encontrada naquelas condições, em lugar ermo. A selvageria de um tempo que não deixa mais rir.
As alegres meninas, agora sérias, tornaram-se adultas de uma hora para outra; essas mulheres.

(Carlos Drummond de Andrade. Contos plausíveis, 1985. Apud. Discutindo Língua Portuguesa. Ano 1, 5)

e que acrescentassem à sua leitura reflexiva outros textos, ainda que não fizessem parte dos textos das TPs ou das AAA.

A escolha do tema, como esperado, trouxe à tona o polêmico caso do aborto da menor de 9 (nove) anos, grávida de gêmeos, moradora de Alagoinha-PE. Esse caso teve repercussão, inclusive internacional, uma vez que o arcebispo de Olinda e Recife teria excomungado os médicos que fizeram o procedimento e a mãe da menor que deu a autorização. Os professores destacaram, também, a relevância do tema uma vez que muitos de seus alunos conhecem exemplos de abuso sexual em sua comunidade e, em alguns casos, eles próprios já foram (ou são) vítimas de violência em seus lares.
Em seguida, sugeri que cada grupo, a partir do tema “violência contra o menor”, pensasse em uma atividade que pudesse ser aplicada em suas turmas do 6º, 7º, 8º ou 9º. Dentre as simulações de atividades, destaquei uma que poderia ser aplicada em uma turma de 6º ano.

GRUPO 1 – 6º ANO
PASSOS:
1 – Divisão da turma em 5 (cinco) grupos;
2 – Leitura reflexiva dos textos nos grupos;
3 - Socialização, oral, das conclusões dos grupos;
4 – Orientação das propostas de produção textual com os diversos gêneros:
4.1 – história em quadrinhos;
4.2 – abaixo-assinado;
4.3 – anúncio publicitário;
4.4 – e-mail para as autoridades;
4.5 – fábula;
5 – Socialização dos textos.

Devido ao avançado da hora, não foi possível discutir a proposta do grupo; aproveitamos, contudo, os minutos finais para nos lembrar de outros gêneros textuais que poderiam ser trabalhados em nossas salas de aula, a saber: uma “carta de despedida” que a menor (vítima de violência) escreveria aos pais, um “retrato falado” do agressor, ou ainda, e mais drasticamente, “um epitáfio”.
Como podem perceber, esse encontro foi muito proveitoso! Agora, é aguardar o resultado do Avançando na prática. Até o próximo encontro.
A todos (e todas) um bom trabalho!

sábado, 2 de maio de 2009

1º Encontro com os professores cursistas - Olinda (PE)




Coivara à moda da casa
Ingredientes
1 (uma) mulher donzela;
1 (um) vaqueiro cabra da peste
1 (uma) boa cama de campanha
1 (uma) caneca de azeite
1 (um) colchão de capim
Modo de preparo:
Pegue um vaqueiro cabra da peste cheio de fogo, junte com uma mulher donzela que queira queimar a madeira e deixe-os a sós numa boa cama de campanha a combinar. Enquanto combinam, coloque uma caneca de azeite para não chiar. Espere uns 20 minutos e deixe o fogo queimar a gosto. Aprecie com moderação.
Grupo: Kíria, Ladijane, Saulus, Gustavo
Procura-se um vaqueiro que queira casar-se com a linda Princesa: negra, cabelos encaracolados, muito fogosa e caliente. O cabra tem que ser quente! Dispensa-se os dotes, mas tem que ter pelo menos uns dois lotes. [...]
Grupo: Eligivânia Macêdo, Iolanda Lacerda, Renata Araújo, Israel de Oliveira